Um pouco de cenário macroeconômico mundial e brasil (04.10.2023)

Cenário Internacional:


Na China, o governo tem buscado incentivar a economia, reduzindo taxas bancárias, injetando liquidez, com o intuito de estimular o setor privado, os consumidores e para que os sérios problemas no setor imobiliário não se espalhem para o setor bancário e para a economia como um todo. Porém, os estímulos na China não estão saindo como o governo esperava, com o setor privado bastante tímido, consumidores receosos com o possível menor crescimento da economia nos próximos anos e com as maiores empresas do setor imobiliário apresentando sérias dificuldades em honrar seus compromissos financeiros. É importante lembrar que a China é o maior parceiro comercial do Brasil, com 30% das exportações brasileiras indo para o gigante asiático. Sendo assim, um enfraquecimento efetivo da economia chinesa não seria nada bom para a economia brasileira.

Estados Unidos e Europa vivem situações semelhantes, ambos buscando um efetivo controle da inflação. Essa questão é sempre um certo trade-off, sendo o aumento das taxas de juros o responsável por começar a reduzir a inflação e, ao mesmo tempo, por enfraquecer a economia. Os Bancos Centrais têm esse dilema: Qual o nível de juros “ideal” para reduzir a inflação e, além disso, causar o menor impacto negativo possível no mercado de trabalho e na economia como um todo?

Com essa questão em mãos, o FED (Banco Central norte-americano) manteve a taxa de juros (Fed Funds) inalterada no mês de setembro, ficando em 5,50% ao ano. Já o BCE (Banco Central da Zona do Euro) subiu em mais 25bp, deixando a taxa de juros da Zona do Euro em 4,50% ao ano. Já há sinais de arrefecimento da inflação em ambos e isso pode sinalizar, provavelmente, um ciclo final de aumento de juros nos Estados Unidos, mas um ciclo “quase final” de aumento de juros na Europa.

Mas o que significa e o que aconteceu em setembro?  

As mensagens dos comunicados, tanto nos EUA quanto na Europa, foram duras, dizendo que a batalha contra a inflação ainda não está vencida – ainda mais com os mercados de trabalho extremamente fortes – e que o cenário futuro merece bastante cautela, com novos aumentos de juros não descartados. Nos EUA, Jerome Powell (Presidente do FED) deixou claro que, caso não aconteçam novos aumentos de juros, o atual nível de juros deve permanecer por mais tempo (higher for longer), jogando água fria nas expectativas dos investidores americanos sobre possível corte de juros no curto prazo.

Essa quebra de expectativas por parte do mercado fez com que a renda variável (especialmente ações), tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, tivesse queda acentuada, com o S&P 500 (principal índice americano de ações) caindo aproximadamente 5% em setembro e o Euro Stoxx 50 (composto pelas 50 empresas de maior negociação nos mercados europeus) caindo em torno de 3% no mesmo período.

Todo esse cenário, na minha opinião, ainda é reflexo da enorme quantidade de dinheiro injetada na economia por parte dos Bancos Centrais para combater a pandemia da covid-19 em 2020. Esse movimento foi mais intenso nos Estados Unidos, com as famílias recebendo polpudos cheques do governo naquele período. O dinheiro que não foi utilizado para as necessidades básicas, foi poupado e investido, resumidamente, em imóveis e ações, inflando os preços desses ativos (imóveis subiram mais de 30% de lá para cá e o índice Preço/Lucro do S&P 500 se encontra em 24, bastante acima da média histórica de 14). Agora, os Bancos Centrais têm o desafio de reduzir a inflação e desinflar a economia sem que haja muita instabilidade, desemprego, redução de PIB, recessão. Conseguirão?

Brasil:

            O mesmo movimento que impulsionou a renda variável no Brasil após o final de março traz, desde o mês de agosto, volatilidade considerável para os mercados. Me refiro às medidas fiscais brasileiras (sobre a sustentabilidade da dívida pública). No final de março deste ano, quando o novo arcabouço fiscal foi aprovado e se iniciou mais veemente uma conversa sobre a reforma tributária, o mercado de renda variável brasileiro (ações especialmente) se destacou positivamente. Além disso, as taxas dos títulos públicos vinham caindo, como sinal não só de uma taxa SELIC menor, mas de um cenário fiscal futuro com melhores perspectivas. Porém, desde agosto, os investidores têm estado reticentes com a possibilidade de as metas propostas para equilibrar as contas públicas não serem factíveis de serem atingidas. O relatório fiscal do Tesouro Nacional divulgado na semana passada mostrou que o governo central teve um déficit primário (gastou mais do que arrecadou) R$ 104 bilhões de janeiro a agosto deste ano, sendo que a meta proposta pelo novo arcabouço fiscal é ZERAR esse déficit já em 2024. Será uma meta factível? Essa é a grande questão.

Com a situação atual, é esperado para o final de 2023 um déficit primário na casa dos R$ 100 ou R$ 150 bilhões e, as medidas fiscais que o ministério da fazenda anunciou – visando o aumento de receitas – além de precisarem de aprovação pelo congresso, não garantem uma entrada de caixa imediata para o governo. Somado a isso, o mercado norte-americano de renda fixa tem sugado bastante recurso da renda variável brasileira, ao passo que os investidores americanos, que desde 2010 estavam acostumados com juros 0%, agora recebem mais de 5% a.a. “sem risco” em seus títulos do governo (treasurys).

Com essas questões pairando na cabeça dos investidores, o mês de setembro foi mais um mês marcado por muita volatilidade. O Ibovespa (principal índice de ações brasileiro) fechou levemente no positivo (+0,71%), mas as taxas dos títulos públicos, que vinham caindo, voltaram a subir (desde agosto), trazendo muita oscilação no mercado de títulos e rentabilidades negativas inclusive. Esse movimento fez o IMAB11 (ETF de títulos públicos indexados à inflação – NTNBs) cair 1,28% no mês de setembro, por exemplo.

Sendo assim, o cenário proposto de queda da taxa de juros (SELIC) pode não ser suficiente para dar sustentação aos mercados. Se, por um lado, a renda variável (especialmente as ações) e os títulos públicos prefixados e indexados à inflação impulsionam os portfólios a partir de março, por outro, são eles que estão enfraquecendo os portfólios nos últimos dois meses. Qual será o panorama até o final do ano?

04 de outubro de 2023.